VALE EM FOCO

Papo Diário: A Psicologia na Saúde Pública


 A Psicóloga buscou quebrar os estigmas que, de forma popular, no nosso cotidiano, as pessoas tem/trazem o/do seu entendimento sobre a presença da Psicologia. Como também tratou de assuntos relevantes sobre a sua área de atuação dentro da Saúde Pública. 

Por Emaísa Lima

papodiario30@gmail.com¹


Como andam os seus sentimentos? Conexos ou/e desconexos com você, sua família e seus amigos? Alguém já mandou-te procurar um Psicólogo? A partir destes questionamentos a Psicologia elege esse mundo descrito como matéria prima, seja em caráter individual ou coletivo (indivíduo em vivência dentro da sociedade). É com essa diversidade de mundos, internos e externos, individuais e sociais, que o Psicólogo trabalha.

O que irá abranger uma série de medidas adequadas para o desenvolvimento de uma estrutura social capaz de proporcionar a todos os indivíduos de uma sociedade a condição de saúde necessária. Esta definição é utilizada também pela Organização Mundial de Saúde (OMS) contando com a inclusão da Psicologia na Saúde Pública.

Para discutir este assunto, dentre outros, desde que envolvam a Psicologia na Saúde Pública, o Papo Diário, trouxe a Psicóloga, que é Especialista em Saúde Pública, Gestão em Saúde; Saúde da Família e MBA Executivo em Coaching ( em Curso), Thayanna Tavares.

 

[PAPO DIÁRIO: PD] Afirma-se que a Psicologia é a responsável por estudar sobre o comportamento e as funções mentais do homem, seja ele sozinho ou em sociedade. Porém, muitas pessoas da sociedade terminaram por romancizar e pensar: o Psicólogo, apenas, fica sentado e o paciente no divã. Podes, por favor, nos explicar como o seu trabalho é realmente desenvolvido?

[THAYANNA TAVARES: TT] De fato, durante algum tempo a Psicologia se dedicou a públicos específicos, prioritariamente, às elites, o que fazia dela uma ciência e prática, exclusivamente, destinada aos que eram mais abonados. Atualmente, e em virtude de processos históricos que modificaram o olhar e os interesses de mercado dos Psicólogos, houve um processo de saída das ditas “zonas de conforto”, espaços destinados aos atendimentos psicológicos, e a introdução destes em novos espaços de cuidado. Hoje encontramos profissionais Psicólogos atuantes na saúde, na educação, nos contextos sociais mais diversos, no esporte, nas diferentes formas de promoção de cuidado.

Hoje, o Psicólogo é atuante e ativista, se destina às questões emocionais, mas dedica-se também em conectá-las aos contextos biológicos e sociais. 

 

[PD] A Psicologia não se preocupa, apenas, com o papel das funções mentais do homem, mas também com os processos fisiológicos e biológicos que acompanham os comportamentos e funções cognitivas. É correto afirmar que é tudo um conjunto que se unifica?

[TT] Antes de qualquer coisa, a Psicologia se preocupa com a forma como os sujeitos atribuem significados ao mundo que o cerca, enquanto sujeitos sociais, desde muito cedo estabelecemos necessidades de conexão entre pessoas, coisas e situações.

Como dito anteriormente, o conceito de Saúde envolve aspectos biológicos, psicológicos e sociais que ligam e movem os sujeitos em direção as suas múltiplas formas de existir.

 

[PD] A população, ou boa parte dela, ainda tem em mente, aquela ideia, ou ideal, de que os profissionais de Saúde Mental, em especial, os Psicólogos só lidam com loucos/malucos?

[TT] Sonho com o dia em que esse imaginário caia por terra. Essa ideação ainda popular de que Psicólogo é o profissional que cuida de louco surge de uma construção histórica, limitante e adoecedora, que vai à contramão das concepções que envolvem a qualidade de vida sujeitos e coletividades. Ser um profissional da Saúde Mental vai além dos processos de saúde e doença, este profissional busca mediar o ideal e real na busca por bem-estar e qualidade de vida.

 

[PD] Em que posição está a família quando se detecta algum transtorno psicológico no indivíduo?

[TT] A família é parte essencial em qualquer processo de saúde. É ela a primeira estrutura social que os sujeitos são referenciados e cabe a ela também o papel de estruturador das funções individuais e coletivas. A Família é um coletivo tão importante que existe uma estratégia de saúde destinada somente à ela, não é só a mulher, o homem, o idoso, a criança, procura-se uma saúde que transponha essas delimitações e isso tem tudo a ver com a Psicologia, tudo a ver com os valores, os lugares, com as representações e questões emocionais que os sujeitos alimentam e compartilham enquanto família.

Quando a questão está centrada mais especificamente na Saúde Mental -fenômeno estigmatizado durante anos da história humana, pouco discutido nos jantares e almoços familiares de domingo, ou mesmo confundido com fenômenos religiosos- a coisa se torna mais grave, não é só a manifestação da doença que esta ali, há também a insegurança social do estigma do ente querido, se a pessoa for a provedora da casa há também a insegurança do provento e muitos outros desdobramentos.

Por outro lado, a Família é o primeiro parceiro que os profissionais devem procurar, é no seio familiar que o cuidado se faz de fato, é neste local não físico que as orientações de cuidado dos profissionais são executadas e a evolução do caso ocorre, é ali, exatamente ali, que a doença é vivida.

 

[PD] Como lidar com esta geração de jovens, se possível dizermos, não apenas imediatista, mas que vive “alheia” a realidade e ficam presos em confusões sentimentais sem fim?

[TT] Os conflitos internos são processos naturais que existem em todas as fases da vida. O que temos hoje é a evidenciação desses conflitos por meio da abertura de espaços que em outras épocas eram suprimidos pela ausência ou distanciamento afetivo das relações, também cabe dizer que não havia tantos meios de expressão dos sentimentos e canais de comunicação que colocavam as pessoas em conexão imediata com fenômenos como agora.

Estamos convivendo com gerações que antes mesmo de alfabetizar-se já portam smartfones e interagem de múltiplas formas antes mesmo de falar. Todo esse fenômeno interfere diretamente no processo de maturação das questões emocionais e coloca em evidencia a exigência dos sujeitos sobre posicionamentos que nem sempre estão acessíveis naquela fase ou momento.    

 

[PD] A Saúde Pública, em uma de suas definições, acreditamos que a mais simples, serve para organizar os sistemas e serviços de saúde, atuando em fatores condicionantes e determinantes, por meio do controle da incidência de doenças nas populações através de ações de vigilância e intervenções governamentais. Em que parte a Psicologia se aplica na ajuda, no combate, no auxílio destes processos?

[TT] A Organização Mundial de saúde (OMS) define Saúde como "um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de afecções e enfermidades", ou seja, se antes para estar doente bastava ter uma enfermidade, hoje há a necessidade de um olhar mais amplo a respeito das condições de vida e as relações que os sujeitos estabelecem consigo, com o território e os significados que atribui a todo esse contexto.

Desse modo, vejo a Psicologia como um campo extremamente vasto e colaborativo para a Saúde Pública, já que ela apresenta como um de seus objetivos colaborar para a produção de políticas públicas destinadas à Saúde, qualidade de vida e bem-estar.

 

[PD] Com a implantação do Sistema Único de Saúde (SUS), no ano de 1988, tem-se o auxílio de uma equipe de multiprofissionais no auxílio ao trabalho com a Saúde Mental integrando um novo modelo de atenção. Em que parte ajuda ou não a Psicologia?

[TT] Cabe antes de qualquer coisa referenciar o papel inovador do SUS para a saúde brasileira, pois além de um sistema democrático que abrange universalmente a população, também busca contemplar o sujeito de maneira integral visando os aspectos Biopsicossociais.

Todo esse contexto de inovações ultrapassa a barreira ideológica e política, e requer novos posicionamentos tanto dos usuários quanto dos trabalhadores que em primeiro lugar passam a abster-se do locus de supremo saber diante dos demais personagens desse contexto.

Essa nova postura exige também o estreitamento dos saberes e consequentemente, a afirmação de novas formas de relacionamento profissional, um local muitas vezes simbólico e sempre real, de encontro de competências aqui entendido como prática Multiprofissional.

Atualmente, entende-se a Prática Multiprofissional como um quesito de extrema relevância para a produção de saúde, visto a necessidade de contextualizar o ideal e o real, ou seja aquilo que se pretende e aquilo que se tem, na produção de bem-estar e qualidade de vida.  

 

[PD] Quais são as suas percepções, através de sua vivência diária, no que concerne a Psicologia, na Saúde Pública, aqui no Vale do São Francisco?

[TT] A Saúde Pública surgiu como foco de interesse em minha vida, através de um Estágio de Vivência no SUS, um programa de formação para estudantes de graduação de diversas áreas da Saúde que através de imersão em cenários reais possibilitava o desenvolvimento do senso crítico dos muitos conceitos que envolvem a Saúde Pública no Brasil.

De lá para cá, além de amadurecer enquanto profissional, Psicóloga, entendi que a Saúde não depende somente do amor dos profissionais pelas funções que desempenha, mas também da qualidade dos insumos, dos interesses políticos e da gestão.

O Vale do São Francisco pode ser simbolicamente comparado a uma pepita de ouro, pois temos centros de formação de profissionais de alta qualidade, com equipamentos e tecnologias eficazes, mas ainda esbarramos em questões gerenciais graves, que nos impedem de ser o que sonho, que ainda nos impedem de ser referencia em Saúde. 

 

[PD] É correto afirmar que a Psicologia construiu novas possibilidades de atuação através do uso de multiprofissionais especializados na busca da adaptação aos novos modelos de atuação de promoção de Saúde publica?

[TT] Posso dizer que sim, e afirmo ainda, que não só a Psicologia teve que se reinventar e se adequar aos novos modos de produzir cuidado. Para que esse movimento se tornasse possível, foi necessário que novas projeções de mercado fossem prospectadas e que os profissionais se permitissem sair dos seus campos de conforto para produzir espaços mais ativos de cuidado.

 

[PAPO DIÁRIO: PD] A pergunta que não quer calar: Quando devemos procurar um profissional de saúde mental?

[THAYANNA TAVARES: TT] Sempre! Cuidar da Saúde Mental é sempre necessário, não somente no momento da crise, mas como prevenção de doenças e promoção da Saúde, do bem-estar e da qualidade de vida. Precisamos superar a ideia ainda vigorante da cura, do medicamento, do imediatismo. Precisamos antes de tudo, entender nossas relações, os sentidos que damos ao mundo que nos cerca, precisamos nos conectar com nossas crenças, com nossa historias, criar estratégias para romper com lógicas perversas, limitantes e pouco frutíferas.

 

¹O Papo Diário, semanalmente, terá o intuito de esclarecer, trazendo de uma forma mais dinâmica, leve e descontraída, assuntos que sejam relacionados à Área da Saúde, com profissionais especializados, por meio do uso de perguntas e respostas, fazendo com que os nossos leitores fiquem mais conscientes sobre este tema.

 Participe/colabore: papodiario30@gmail.com.

 

 

 

 

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